Os meios e os fins
Em frente de mim, o grande ecrã de plasma do café, em que se sucedem os videoclips de entertenimento, repletos de efeitos especiais.
Ou, cá estou eu encaixado no meu lugar do airbus da BA que arranca com piloto automático, no meio de um capacete de nevoeiro que cobre Lisboa, a caminho dos dez mil metros, rumo a Londres.
Espectáculo! Como hoje se usa comentar.
Mas o reflexo que me vem à consciência neste momento, é outro:
Não vivemos hoje uma era prodigiosa no domínio dos meios, mas de uma grande pobreza ou superficialidade no dominio dos "fins"?
Ficamo-nos pelos fins intermédios que remexemos até à exaustão.
...E assim saberemos cada vez mais de cada vez menos, indo a caminho de saber tudo de coisa nenhuma, num processo de fragmentação da consciência que não será estranho a uma insustentável desintegração eco-social.
Casualmente, cai-me debaixo dos olhos esta observação de Castoriadis: "A expansão ilimitada de um pseudo-domínio é procurada por si própria, desligada de qualquer finalidade(...)".
Perdemo-nos pelo meio. Ou pelos meios.
Com as vistas curtas de um pragmatismo redutor, menosprezamos a filosofia não vendo nela mais do que a procura do sexo dos anjos, apegados a um racionalismo estreito.
Não somos capazes de ver mais longe e assim vamos navegando a vista, criando novos problemas com a resolução engenhosa mas fragmentada dos problemas anteriores.
Ficamo-nos pelos fins intermédios, sem folego, ou vontade de ir mais fundo.
Até que ponto esta navegação à superficie não deriva de uma descrença relativista alimentada pelo exercício sistemático da crítica?
Não pondo em causa o espírito crítico de uma sociedade aberta, pode questionar-se se será possivel vivermos sem acreditar em nada, ou se será possível acreditar em valores essenciais de ordem ôntica, sem nos encerrarmos numa sociedade fechada, enclausurada em dogmas.
Será esta desorientação própria de uma sociedade em crise? Krisis permanente da abertura democrática segundo Eduardo Lourenço, ou crise decadente de uma sociedade a braços com os custos crescentes da complexidade a que chegou, segundo Tainter?
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