A frieza dos números
" ... ó geração de vapor e de pó de pedra, macadamizai estradas, fazei caminhos de ferro, construí passarolas de Ícaro, para andar a qual mais depressa, essas horas contadas de uma vida toda material, massuda e grossa como tendes feito esta que Deus nos deu tão diferente daquela que hoje vivemos. Andai, ganha-pães, andai : reduzi tudo a cifras, todas as considerações deste mundo a equações de interesse corporal, comprai, vendei, agiotai.
No fim de tudo isto, o que lucrou a espécie humana ? Que há mais umas poucas dúzias de homens ricos.
E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico? (...) cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis. "
(Almeida Garrett, in " Viagens na Minha Terra ", 1843 )
O patriarca Adam Smith fora mais conciso: "Quando existem grandes propriedades existem grandes desigualdades. Por cada homem muito rico devem existir pelo menos quinhentos pobres."
Ao tempo, teorizava-se sobre a "utilidade da pobreza" e desde o século XVI que as "poor laws" e das "workhouses" britânicas tratavam de tirar partido da força de trabalho.
O utilitarismo britânico é inultrapassável! Nele se deve radicar em grande parte o calculismo torpe que nos reduz a "recursos humanos" e grassa actualmente entre os mandarins e sacerdotes da economia mercantil! Não vai ser fácil livrarmo-nos de toda esta gente que faz o mal e a caramunha (1)!
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(1) "Hoje, sempre que vos aparece no écran da televisão um economista com funções governamentais, não duvideis", adverte, com o coração revoltado, Miguel Real em A nova teoria do mal, "eis a face repelente do mal, aquele que levou a Europa à decadência e se prepara alegemente para destruir o planeta"
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