A aldeia e a cidade
A aldeia e a cidade.
Na aldeia, no mundo rural como na pequena cidade provinciana, todos se conhecem. A comunidade impõe-se ao indivíduo, como os laços de sangue. A entreajuda coexiste com a coscuvilhice.
Essa pressão da comunidade não existe na cidade cosmopolita.
As relações humanas tendem a ser ocasionais ou institucionalizadas, funcionais , o mercado está aí "en su sitio" e, nestes termos o mercado casa-se com a liberdade, a liberdade individual.
O indivíduo escolhe as suas relações, não se sujeita ás que lhe impõe a comunidade como acontece na província.
Perdem-se as relações afectivas no torvelinho das circunstâncias, falece a entreajuda e com o individualismo nasce o isolamento, a solidão acentuada pelo envelhecimento da população, numa espécie de liquefação social.
Com as "novas tecnologias", com a internet, a cidade globaliza-se.
Não é a aldeia que se globaliza, mas a cidade cosmopolita.
A ideia da aldeia global não tem razão de ser!
Mas será possível prescindirmos de repente dessa milenar relação afectiva com os outros, com mundo a nossa volta, com a natureza?
Há quem não consiga trocá-la pela liberdade individual e fuja da cidade cosmopolita.
Há também quem procure de alguma forma acolhê-la na cidade.
A ideia de "unidade de vizinhança", numa cidade feita de "bairros" vai nesse sentido de salvaguardar a vida comunitária.
E há hoje a feliz possibilidade de a acolher nos subúrbios que, graças à difusão das "novas tecnologias", poderão deixar de estar condenados à sua aviltante condição de dormitórios. As "novas tecnlogias" podem favorecer o global, mas também o local! Trabalhar em casa ligado a todo o mundo pela net é uma possibilidade e uma preferência para muitos trabalhadores por conta própria e por conta de outrem, em empresas que já hoje aceitam essa situação. A permanência de pessoas durante todo o dia traz consigo comércio de proximidade, escolas e outros equipamentos sociais, animação urbana. Muitos dormitórios podem assim converter-se em "wired communities", constituindo atraentes "unidades de vizinhança". Mas, para isso, o trânsito rodoviário tem que ser "acalmado", transferindo para uma rede de praças, passeios ou ruas de peões a função estruturante do "espaço público".
Mas numa cidade feita bairros ou "unidades de vizinhança" perde-se a convivência urbana se não houver um centro vivo, congregador e identitário, em que todos os cidadãos se encontram em liberdade, nos bons e maus momentos da polis.
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Nota: O desenho é de Walter Schwagenscheidt (1886-1968). Schwagenscheidt trabalhou com Tassilo Sittmann no plano expansão de Frankfurt para Noroeste, em que procurou aplicar as suas ideias sobre a cidade. Defendeu a domesticação do automóvel e a conjugação da privacidade com a vida comunitária em atraentes livrinhos como o EIN MENSCH WANDERT DURCH DIE STADT ("Um homem passeia pela cidade"), recheados de imagens, sugestivos apontamentos e esquemas. Tenho a informação não confirmada que andou pelas aldeias do Alentejo.
2 Comments:
Realmente as wired communities transformaram o ambiente laboral (e consequentemente tudo a volta dele), mas nao so. Criaram espaços de lazer, que podem ter uma expressao fisica; por exemplo grupos de pessoas que se reunem para correr, ou para discutir livros. Nas cidades antigas era demasiado dificil isso acontecer, porque ao haver tanta coisa nao havia modo de "indexar" as coisas que nos interessavam. Nas aldeias nao acontecia, porque nao havia e as pessoas nao tinham acesso ao que se passava nas aldeias perto da sua (por falta de informaçao e tb por falta de transporte!)
Agora at'e podem haver partidos "virtuais", como o PP, que unem atraves da internet uma comunidade separada no espaço, mas com caracteristicas bem "reais" (e at'e assentos em Bruxelas!).
Interessante!
As "novas tecnologias" podem trazer vida a comunidades locais, não só porque, quebrando o isolamento, favorecem a permanência das pessoas, mas também porque estimulam relações de proximidade (criam "espaços de lazer, que podem ter uma expressao fisica; por exemplo grupos de pessoas que se reunem para correr, ou para discutir livros").
Reparo que o sentido que dei a "wired community" é o de comunidade local ligada à net, e o sentido que lhe dás (o mais corrente) é o de comunidade que existe no espaço "virtual" da net. Os dois sentidos estão patentes no comentário que acabei de fazer.
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