Reflexões Planetárias

Monday, March 28, 2011

Mudar de vida!

"Partilho da convicção de muitos portugueses de que o seu nível de vida melhorou muito depois do 25 de Abril, de que houve um grande "progresso".
Agora o reverso da medalha: Será que esse progresso é "sustentável"?
Penso que não.
Desde logo em termos económicos. A produção não acompanha a explosão do consumo. Deixamo-nos enveredar pelo consumismo e não produzimos, em quantidade, a diversidade dos bens e serviços que consumimos.
Por isso, temos que importar cada vez mais. E não produzimos para exportar o necessário para compensar as importações.
...
Este "progresso" foi, até hoje, artificialmente sustentado pelo Fundo Social Europeu que deveria ter sido utilizado para montar uma economia sustentável, um sistema produtivo olhando a satisfação das necessidades que temos por fundamentais e a exportação para compensar as importações do que necessitamos mas não produzimos.
Mas não foi isso que aconteceu. Foi, pelos vistos, irresponsavelmente "mal aplicado " e acabou por ser desperdiçado no consumo de bens e serviços importados. Esse dinheiro fugiu do país em pura perda".
Esta nota foi escrita por um pacato mas preocupado cidadão comum, em Fevereiro de 2005. Vinte anos passados sobre a nossa adesão à União Europeia: dez anos do PSD de Cavaco que ficou por cá, mais 7 anos do PS de Guterres que fugiu, mais dois do PSD de Barroso que fugiu também, mais um do PSD de Santana que "anda por aí".
Mais seis anos do PS socrático de mais do mesmo e aqui estamos nós em 2011, desarmados (1), com um governo corrompido e fraco para enfrentar o grande assalto lançado pela Banca ao Estado. Sobre o Estado depauperado por má gestão e descapitalizado a favor dos bancos na oportunidade da crise dos "subprime" que provocaram.
Grande assalto dos bancos hoje protagonizado pelo conluio entre os "mercados" e as "agências de rating", na mira dos juros da incontida divida pública e, amanhã provavelmente, pelos compradores de serviços públicos a preços de saldo, a coberto da política de austeridade que se anuncia!
A entrega, a preços de saldo, a uma pequena minoria de grandes investidores estrangeiros, de serviços públicos que envolvem "monopólios naturais", recursos vitais e são o produto de décadas de trabalho de milhares de pessoas, será um acto "odioso". Sendo consequência de condições impostas na negociação da dívida, estas "privatizações" tornam a dívida "odiosa" e constituem um dos maiores desafios que se colocam à nossa geração. Nestes termos, não há que esperar senão mais do mesmo da parte dos poderes instituidos, estando já à vista uma negativa regulação em tendência entre a acumulação de juros e a recessão económica que apenas beneficia alguns parasitas oportunistas, grandes e pequenos, de fora e de dentro.
Cabe-nos as nós, hospedeiros, sustar este processo arrastando o governo para um projecto colectivo mobilizador que situe a "restruturação" da dívida no plano de um crescimento económico responsável, rumo a um desenvolvimento ecologicamente sustentável (2), deixando de estimular o consumismo com facilidades de crédito e publicidade invasiva, contemplando a revalorização dos nossos recursos endógenos no contexto da produção, com vista ao consumo interno e à exportação, para compensar importações incontornáveis.

Temos que deixar de ser bons alunos de maus professores. Temos que bater o pé a esta Europa e revalorizar os nossos laços ancestrais com o resto do mundo noutros moldes. Temos que abandonar a economia neo-liberal, o "consumo conspíquo" armados em "novos ricos".
Temos que mudar de vida!
A propósito, Matthew Frederick faz-nos notar que o símbolo chinês de "crise" é composto por dois caracteres: Um indica perigo, o outro oportunidade!
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(1) Estamos hoje desarmados, porque a nossa actividade produtiva está desconjuntada pelo mau aproveitamento dos fundos europeus e pela internacionalização da economia no contexto da globalização neo-liberal.
Afigura-se muito convincente a atribuição da actual crise económica à financeirização da economia, promovida pelo capitalismo financeiro neo-liberal desde os anos oitenta, com Tatcher, Reagan e os "Chicago boys" de Friedman e Hayek.
Parece lógico que as economias mais frágeis como a nossa são abaladas em primeiro lugar, resistindo mal aos artifícios e vícios neo-liberais.
Nesta óptica, há "culpas" de Socrates e da nossa economia, mas que elas não desculpabilizem o neo-liberalismo e os neo-liberais, sob pena de não sairmos do beco em que nos metemos com eles. Quem, como eu já tinha idade para ter consciência destas coisas nos anos sessenta, não corrobora a ideia de que os portugueses e os católicos são "por natureza" gastadores. Pelo contrário, prevaleciam habitos tradicionais que não são dessa natureza! A incentivação do consumo veio nos anos setenta com a penetração da economia de mercado, remoçada por MIlton Friedman. Coincidiu como 25 de Abril... o que leva muita gente a confundir tudo. Mas nós que entretanto já tinhamos mais uns anos, sabemos que isso foi uma infeliz coincidência do 25 de Abril com a eclosão do neoliberalismo que deu na crise em que nos encontramos hoje, ainda por cima "geridos" por um fundamentalista do mercado: Vitor Gaspar!
(2) Explicando melhor: reconhece-se a necessidade de um quantum satis de crescimento económico que se encara como fase de transição para um desenvolvimento que se situe dentro da capacidade de carga do meio natural. Um exemplo singelo : em vez de importar e produzir termoacumuladores eléctricos, enveredar decididamente pela produção de sistemas de aquecimento solar de águas domésticas, vulgo "colectores solares", para equipar as nossas casas e para a exportação.

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