A Senhora "Dívida Pública"
A "Dívida Pública" - agora na ribalta do nosso teatro mediático - está afinal conosco há muito tempo como se pode constatar pelo registo da pulsação desta senhora ao longo dos últimos 160 anos (1).
Com Salazar a senhora Dívida mingúa mas o país continua pobre.
Depois do 25 Abril o país "enrica" e a senhora Dívida trepa. No tempo das vacas gordas, Cavaco apenas deixou a dívida a bater teimosamente nos 60% do PIB. Curiosamente, com Guterres ela ameaça descer para depois trepar sem remissão até aos nossos dias adubada finalmente pelos gulosos "mercados".
São os comentários singelos de um leigo em economia.
Pedi a alguns economistas meus amigos o favor de comentarem este gráfico.
Recebi este comentário de Filipe do Carmo que agradeço:
"A subida da dívida parece estar intimamente ligada ao regime democrático (não propriamente à democracia mas ao que ela trouxe implícita: a necessidade de satisfazer as clientelas). A partir de 2001 a influência das facilidades de crédito ligadas ao euro parece inegável. O período que precede não me parece que tenha significado um período de travagem. Talvez esteja ligado ao aparecimento das habilidades contabilísticas (parcerias público-privadas, etc) e ao começo das vendas de activos (privatizações)". Aqui temos uma explicação para a ameaça de descida no tempo de Guterres.
Recebi de Julia Mariquito a indicação e o endereço do blog de Álvaro Santos Pereira. Lá está o gráfico da dívida pública e a explicação da subida vertiginosa nos últimos dez anos que contem as criticas que tem vindo a ser veiculadas pelos "média", ao comportamento do governo nas contas públicas e que se pode traduzir numa palavra: desgoverno (2).
O cidadão comum como eu que paga os seus impostos e controla as suas dívidas, fica surpreendido ao lhe ser dado a conhecer que a dívida se estende ás famílias e ás empresas e que, por junto ultrapassa largamente o nosso Produto Interno Bruto!
Há limites! Vivemos num clima de irreponsabilidade generalizada, sem nenhum projecto colectivo mobilizador, navegando à vista dos subsídios e à mercê dos estímulos dos banqueiros e economistas que nos tratam como Pavlov tratava os seus câesinhos: Tomem lá juros baixos e toca a comprar casinhas; tomem lá cartões de crédito e toca a consumir...(3).
Mas, para além disso, ou antes disso e quanto ao andamento da dívida pública depois dos anos de vacas gordas de Cavaco, poder-se-à ignorar os efeitos da aplicação do artigo 104º do Tratado de Maastricht que proíbe os Bancos Centrais de financiar os Estados, expondo-os à especulação bancária?
(1) Agradeço a Augusto Mota o envio deste interessante gráfico vindo do Prof. Aguiar-Conraria e de que agora conheço as fontes pelo livro de Santos Pereira, "Portugal na Hora da Verdade". O gráfico que suponho ser de Santos Pereira, combina três fontes: 1859-1900: Neves(1994); 1900-1993: Mata e Valério (1994), 1974-2010: AMECO, Comissão Europeia.
(2) Santos Pereira apresenta um pacote de medidas para responder a esta grave situação financeira que se afigura poderem vir a ser adoptadas pela troika.
Entre elas, obviamente a redução das despesas do Estado... salvo nos sectores da Saúde e da Educação! :-)
Mas lá estão os trabalhadores a pagar as favas, com flexibilizações, mais impostos e reduções de salários... que não os bancos que continuam a usufruir dos seus baixos rácios de reservas e a viver no seu "paraíso fiscal"! :-(
Nas medidas económicas, enfatiza o crescimento das exportações e a competitividade, com medidas genéricas para mim pouco convincentes, mas não a cooperação e a produção para o consumo interno e a substituição de importações, aproveitando as potencialidades e respeitando a capacidade de carga do nosso território: a economia continua a ser concebida como um "sistema fechado", apegada a conceitos hoje inaceitavelmente incongruentes como o PIB, incapaz de dar sinais ás actividades humanas e ao ordenamento do território, no sentido de um desenvolvimento sustentável.
(3) Em 2008, quando estalou a crise dos subprime, Tom Friedman, o colunista do NYT e autor do "Mundo é Plano" (!) traçava um retrato dos Estados Unidos como um país improdutivo sentado em cima dos cartões de crédito que nos assenta como uma luva. Transcrevo o que ele diz a certo ponto do artigo, citando Van Jones:
"It's time to stop borrowing and start building. America's No. 1 resource is not oil or mortgages. Our No. 1 resource is our people. Let's put people back to work - retrofitting and repowering America... You can't base a national economy on credit cards. But you can base it on solar panels, wind turbines, smart biofuels and a massive program to weatherize every building and home in America. Innovation in areas such as renewable energy, green building, and sustainable agriculture can invigorate the global economy by helping businesses stay at the cutting edge, which is essential for retaining existing jobs and creating new ones."
Um modelo de capitalismo sem travões que não podiamos seguir porque não temos a capacidade de fabricar e impor dolares (ou euros) a todo o mundo... Nem os Estados Unidos talvez num futuro próximo. Um modelo insustentável que tem que ser abandonado rumo a uma economia sustentável, como defende Van Jones citado por Friedman.
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