Recuemos dois séculos.
Uma vida melhor ao alcance de todos. Numa Europa pobre, aumentar o nível de vida era um primeiro passo.
À partida, produzir, produzir muito e barato era uma boa coisa, pondo a máquina do progresso ao serviço de todos, integrada num sistema económico-social eficaz.
Mas os empreendedores burgueses, os empresários, os capitalistas tornaram-se viciados no negócio, insaciáveis, e os custos do progresso foram-se acumulando na sociedade e na natureza.
O capitalismo atingiu a sua primeira grande crise recessiva entre as 2 grandes guerras, ameaçado pelo comunismo soviético.
Devastada pela 2° grande guerra, a Europa repõe as condições iniciais do capitalismo: ela é de novo um continente de povos carenciados.
Produzir, produzir mais e mais para reconstruir e aumentar o nível de vida depauperado tornou-se de novo prioritário.
Mas agora com a experiência social anterior e o risco dos povos se passarem para o lado comunista, junta-se o capital com o estado social no modelo keynesiano que se organiza ao nível do estado-nação.
Anos de ouro! Sucesso, progresso económico e social. Mas "esquecemo-nos" dos outros, do "terceiro mundo" bem como da natureza e, com ela, das futuras gerações. No futuro estamos todos mortos ripostava Keynes absorvido pelo presente!
E de novo o capital se vicia, à medida que se agiganta - a velha húbris persiste! - e os custos sociais e ambientais agravam-se com a inevitável concentração do poder económico por via da competição, em empresas internacionais, multinacionais, transnacionais que se medem com os estados.
O modelo keynesiano não está armado para esta guerra, pois organiza-se ao nível do estado-nação que vai perdendo força, face aos potentados económicos que se globalizam tomando o seu lugar na exploração do "terceiro mundo".
Os governos são corrompidos, o estado é enfraquecido e a sua função social privatizada a partir dos anos oitenta.
Isto é: 0s trabalhadores, os mais pobres e a classe média, vão ficando à mercê dos mais ricos, da oligarquia possidente, num sistema económico-social de acumulação cada vez mais instável e desestabiilizador. À escala planetaria. O poder económico reina sobre o poder político e ambos sobre uma sociedade civil fragmentada!
Uma terceira novidade agrava a insegurança, a incerteza e, com elas a ansiedade. A emergência das novas tecnologias catapulta o mercado bolsista para fora da "economia real" em crise de crescimento: a contabilidade, as finanças que eram subsidiárias da economia tornam-se soberanas. Manda o valor monetário das acções, mandam os mercados como hoje se diz capciosamente. Os antigos empresários convertem-se em especuladores ou jogadores de casino.
O crescimento boolímico das empresas, da produtividade e do mercado bolsista associado as novas tecnologias, tudo isso é fruto do sucesso keynesiano, mas é tambem o seu coveiro mais interessado.
Reina hoje um neo-liberalismo, um liberalismo agora livre dos velhos travões morais. Um neo-liberalismo de casino em que tudo está a mercê dos interesses... bolsistas!
Com ele, os conflitos sociais agravam-se, bem como o estado do planeta. A crise energética nos anos setenta e a ecológica nos anos noventa saltam para o domínio público questionando-se a sustentabilidade do padrão de vida consumista.
Quero crer que cada vez mais gente toma consciência desta situação e se organiza para refazer a sociedade em moldes sustentáveis.
É uma mutação social que está em marcha e que se tem que impôr. Em nome de uma vida melhor, na melhor hipótese. Por uma questão de sobrevivência, na pior.
Obs: Assim como o liberalismo começou por uma boa ideia mas se ficou pelo meio caminho da produtividade capitalista concentrando-se o poder em grandes grupos economicos, também o comunismo começou pela boa ideia social -esquecida pelo capitalismo- mas se ficou pelo meio do caminho da ditadura do proletariado (resposta ao abuso capitalista no quadro de uma luta de classes entre o capital e o trabalho) num capitalismo de estado dominado pela nomenclatura. Também nele a natureza é esquecida, talvez com maior brutalidade do que no capitalismo.
O comunismo sovietico caiu primeiro perdendo a guerra fria. Mas o capitalismo sobreviverá no "fim da história"?