Organizemo-nos!
Não nos iludamos. Ou nos salvamos a nós, ou ninguèm nos salva
Manuel Laranjeira (1)
O rei vai nú! O mercado livre - o free market - revelou-se um mito desastroso. Trinta anos de desregulação mercantil conduziram à crise social e ecológica em que hoje nos encontramos. As intervenções feitas à luz do Consenso de Washington com o respaldo dos Estados Unidos brutalizaram terras e povos em todo o mundo, no hubrístico propósito de impor a religião do free market! Os Estados Unidos mais parecem um monstro desesperado e a Europa está à deriva. Precisamos de conseguir um quantum satis de autosuficiência cuidando o nosso jardim plantado à beira mar. E resistir, resistir sem desfalecimento ás imposições da banca, à ofensiva dos mercados financeiros.
Só a participação em rede de uma diversidade de activas "organizações da sociedade civil" poderá fundamentar um programa de governo á nossa medida e obriga-lo fazer valer as nossas prioridades nas negociações com os mercados internacionais.
Precisamos urgentemente desse governo. Temos pela frente, neste país à razão de juros, a "missão impossível" de subordinar as finanças à economia e a economia à sociedade e à ecologia, pondo a tecnologia ao serviço do "bem comum". Teremos então que renegociar a dívida externa subordinando-a ao crescimento da economia no curto prazo, sem perder de vista o desenvolvimento social sustentável (sem crescimento) a médio-longo prazo.
Neste quadro de instabilidade global em que hoje vivemos, qual poderá ser a ordem de prioridades para o nosso crescimento económico, seguindo o "princípio da subsidiariedade", traduzido num quantum satis de autosuficiência? Parece-me ser a seguinte:
1. Abandonar o consumismo e definir as nossas prioridades, tendo em conta as nossas capacidades(>2); cabe-nos a nós definir o que é fundamental para a nossa "qualidade de vida";
2. Produzir, desenvolvendo as nossas capacidades para satisfazer as necessidades tidas por fundamentais (>1);
3. Importar os bens e serviços que não conseguimos produzir para satisfazer as nossas necessidades finais(>1) e intermédias da produção (>2).
4. Produzir para exportar e, assim, compensar as importações (>3), de acordo com as nossas capacidades e a procura externa.
5. Enquadrar as medidas anteriores numa política avisada de solidariedade internacional.
Não é esta a "ordem de prioridades" do plano de governo PC (Passos Coelho!) que, em obediência aos mandarins e sacerdotes do mercado, embarca sem rebuço na internacionalização da economia que é como quem diz, na globalização capitalista. Segue o modelo alemão: reduzir o consumo interno e exportar. Este modelo serviu sobretudo a Alemanha, também a França, mas não países como Portugal que, entregue ao centrão dos interesses, desmantelou a agricultura, as pescas e a indústria a troco de dinheiro para pagar importações e se entregou ao crédito fácil, endividando-se aos bancos que agora nos têm na mão "à razão de juros" especulativos(2).
Mas agora, exportar para onde? Com todos a reduzir o consumo e a querer exportar, não se percebe quem vai importar!
Em frente com mais do mesmo, precisaremos de um mundo extraterrestre ávido de consumo... e de um outro para mudar de casa pois, por este andar, esta, torná-la-emos inabitável!
Ou talvez não. Raciocinando em termos econocráticos, talvez misturando o progresso tecnológico com uma drástica quebra de população mundial se resolva o embróglio. Ficarão um milhão de ricos e... robots!
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(1) O autor citado publicou em 1908, no jornal "O Norte", uma série de quatro artigos dedicados ao "pessimismo nacional", de onde vem esta citação. A quem se dirige Manuel Laranjeira e que pessimismo era esse que ele atribuia ao Portugal de então? A resposta requer a leitura do conjunto dos artigos, mas pode adivinhar-se neste trecho:" O nosso pessimismo quer dizer apenas isto: que em Portugal existe um povo em que há, devorada por uma polvilha parasitária e dirigente, uma maioria que sofre porque não a educam e uma minoria que sofre porque a maioria não é educada". Tudo isto é de cadente actualidade. Hoje!
(2) A Alemanha em particular ganhou em dois carrinhos. Ganhou nas exportações e nos juros do dinheiro que emprestou aos países importadores como Portugal que se endividaram para comprar submarinos e tutti quanti. Observação algo tenebrosa que anda por aí: Os alemães poderão conseguir sem armas o que no passado não conseguiram com elas! Nesse caso qual o papel que nos será atribuído na divisão internacional do trabalho? Alguém disse que a economia (de mercado) é a guerra por outros meios... ou foi o contrário? Tanto faz.