Forma e Função na Arquitectura
Assisti à morte da Antiguidade Clássica no curso de arquitectura, ao tempo uma das "Belas-Artes" albergadas no Convento de S. Francisco. Morreu ao extinguir-se a cadeira de Desenho Arquitectónico com o advento da "Nova Reforma" em 1957.
O Arquitectónico era dominado por um tremendo professor que a zelosa contínua anunciava sempre com a sua vozinha tremula de pavor, como se aí viesse uma grande tempestade: "Vem aí o Mestre!"
E vinha! Quando o Mestre Luís Alexandre da Cunha, "Cunha Bruto" para nós, riscava nervosamente os desenhos traçados com desvelo e mina 4H na superfície imaculada e tensa do papel cavalinho, colado no contorno à prancheta como se fosse um tambor... se não descolasse ao secar, depois de ter sido bem humedecido para o efeito.
"Não tem expressão!", exclamava.
A expressão estava no traço e também nas proporções.
Segundo Vignola, cujo tratado seguiamos religiosamente, cada uma das cinco ordens tem as suas proporções que lhe dão expressão própria.
Um edifício que respeita as proporções da ordem dórica, tem o severo equilíbrio estético da ordem dórica, qualquer que seja o seu tamanho. Puro desenho geométrico, sem tempo nem lugar.
Mas quanto ao equilíbrio estático? Ou melhor, quanto à resistência.
Referindo o tamanho ao módulo, a secção, logo a sua resistência à compressão, varia com o quadrado do raio da coluna (o módulo) e o volume do conjunto, logo o peso próprio, varia com o cubo.
Não variando na forma e nos materiais, um edifício quatro vezes maior do que outro (com um módulo quatro vezes maior) é sessenta e quatro vezes mais pesado, mas as suas colunas são apenas dezasseis vezes mais resistentes!
Aumentando o tamanho, o aumento da resistência não acompanha o aumento do peso próprio, até que chegamos ao edifício que ruirá sob o seu próprio peso!
O edifício será sempre equilibrado do ponto de vista estético considerado, mas não do ponto de vista estático.
Á semelhança estética não corresponde a semelhança estática, por efeito do princípio da similitude.
Pelo princípio da similitude, a forma não segue a função... ou a função não segue a forma.
Há um conflito a resolver. Por exemplo, modificando a resistência dos materiais e portanto os materiais. O uso da pedra em vez do tijolo nos grandes monumentos da arquitectura clássica talvez não fosse extranho a este embróglio da similitude.
Assim como hoje, a procura de leveza e transparencia, não é extranha á imperativa utilização de materiais como o aço e o betão armado em grandes edifícios e pontes.
Pergunta de algibeira a propósito das sombras na figura de Vignola: Estas sombras "clássicas" com projecção horizontal e vertical a 45º, são possíveis numa arcada a sul em Lisboa. Mas em que meses e a que horas?